Era uma vez um sujeito normal. Um homem comum, com sonhos e desejos ordinários, mas com uma característica menos comum: uma bexiga hiperativa desde a infância. Mas quem disse que não podemos ser extraordinários em nossas peculiaridades?
Vivi anos convivendo com essa realidade, lidando com as demandas de uma bexiga um tanto quanto apressada. Ainda assim, sempre mantive um senso de normalidade, uma vida plena e continente que, apesar dos desafios, fluía sem grandes obstáculos. Como um rio que, mesmo com pedras no caminho, encontra seu rumo.
No entanto, em 2021, um inimigo invisível chamado Covid-19 alterou o curso desse rio. A infecção não só me atingiu com a força de uma cachoeira, como também intensificou a hiperatividade da minha bexiga, me deixando com uma sequela que mudou minha vida de uma forma que eu nunca poderia imaginar. A continência que eu conhecia desvaneceu-se, e em seu lugar surgiu uma nova necessidade: a de controlar cada momento, cada atividade. Espontaneidade se tornou um conceito distante, quase como uma lembrança de outra vida.
Na época, a conversa sobre incontinência urinária associada à Covid era inexistente. Me senti como um marinheiro perdido em um oceano desconhecido. Porém, como uma bússola em meio à tempestade, estudos e pesquisas sobre as sequelas da Covid no sistema do trato urinário emergiram a partir de 2022, lançando luz sobre minha realidade e a de muitos outros. A ciência, como sempre, abrindo caminhos e dando esperança onde parecia haver apenas incertezas.
Compreender minha nova realidade foi uma batalha. Não é fácil admitir que você vive com incontinência. É como confessar um segredo que você nunca quis ter. Quando finalmente você reúne coragem para compartilhar, pode encontrar desinteresse ou incompreensão, reforçando o sentimento de isolamento.
Cada dia com incontinência é uma jornada de superação, um exercício constante de coragem. Como eu sempre digo, incontinência é um desafio 24/7. Não há férias, não há folgas. É um lembrete persistente, mesmo quando você está sonhando.
Os produtos de proteção íntima, como fraldas para adultos, tornaram-se meus aliados fiéis. Eles carregam mais do que uma função prática, são um símbolo de adaptação e resistência. Meu desejo? Que o estigma associado a eles desapareça, assim como a sensação de humilhação que muitos sentem ao necessitar desses produtos.
A incerteza de quando a próxima urgência virá é quase tão debilitante quanto a própria incontinência. Seja uma vez por dia ou uma vez por semana, a constante vigilância cansa, desgasta. Mas também fortalece. Me fez perceber o quão resiliente podemos ser.
E assim, meus dias giram em torno de um roteiro bem planejado, com banheiros estrategicamente localizados e uma rotina de controle bem estabelecida. O medo de um episódio de vazamento na presença de outros é sempre presente, mas aprendi a transformar esse medo em uma força motivadora.
Viver com incontinência não é fácil, mas é possível. Pode parecer que toda a sua identidade foi alterada, mas não é o fim do mundo. É preciso força, aceitação e acima de tudo, apoio. Com a ajuda adequada, podemos manter a melhor qualidade de vida possível, mesmo com algumas limitações.
E, finalmente, a incontinência me ensinou uma lição importante: todos temos nossos segredos, nossas batalhas. Mas cada um de nós também tem a capacidade de lidar com essas batalhas de maneira única. E é isso que nos torna extraordinários.
Portanto, a vocês, meus companheiros de jornada na incontinência, eu desejo coragem e força para lidar com a vida da melhor maneira possível. A incontinência pode ser um capítulo em nossa história, mas certamente não é o capítulo final.